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domingo, 24 de abril de 2011

Nem um título eu sei dar



Tá difícil de escrever hoje. Já mudei duas vezes de assunto, já apaguei duas páginas. Não consigo escrever nada decente. Tudo me parece piegas. Tudo me enjoa. E nem mal-humorada eu estou. É que eu não consigo saber do que é que quero escrever. Já falei de contos-de-fadas e de Páscoa, mas assunto nenhum me agradou por nem um instante,  e não podendo suportar as minhas palavras, assassinei-as. Talvez eu esteja exigente hoje. Talvez sem inspiração. Mas eu, que sou teimosa comigo, se decido escrever, obrigo a mim mesma a cumprir tal função. Náusea na alma! É isso o que eu sinto. Eu, que nem sou religiosa e que tenho os dois pés atrás com o capitalismo, comemorei a Páscoa. É. Estou em crise de valores. Tive um feriado com direito a bacalhau, chocolate, almoço e jantar em família. Desejei Feliz Páscoa como quem deseja Boa Sorte. Quando desejo Feliz Páscoa, desejo energias boas. E é só isso. Como bacalhau pela tradição, assim como poderia comer carne vermelha, bem mal passada e dançar em cima da mesa para fazer a digestão. O fato é que isso é uma mentira. Quisera eu ser tão descolada assim da religião ou do capitalismo. Eu adoro ganhar dinheiro e me pesaria a consciência comer carne vermelha. Dançar em cima da mesa? Faço-me rir. Oras, mas logo eu, que tenho teorias tão bonitas e leves com relação à vida? É. Pois é. E aproveitando que eu conto segredos aqui, revelo mais um (que na verdade é o mesmo, mas mais íntimo). Trata-se da minha visão do amor. Vou contar uma coisa minha que é muito séria. Talvez não seja para vocês que me leem, mas para mim, o é. Acontece que eu queria um amor bem romântico e meloso. Sabe pra que? Pra não querer mais depois. E não é que eu seja assim, decididamente louca ou malvada. (Decididamente, nada em mim existe.) Mas é que o meu corpo, a minha alma e o meu intelecto não coincidem. Vejo as cenas mais piegas e ridículas em filmes de comédia romântica. Penso que é um absurdo que alguém faça uma cena daquelas, que seria mais justo se alguns filmes fossem classificados como ficção-científica-para-mulheres do que como drama ou comédia-romântica. Seria mais leal com os espectadores. Seria mais leal comigo. E enquanto assisto a uma cena ridicula e forjada de amor, percebo que escorrem lágrimas dos meus olhos, meus pêlos se eriçam, a barriga sente frio. Ei! O que está acontecendo aí, Srº Corpo? E ele não me ouve, continua me fazendo chorar e arrepiar. E o intelecto se envergonha. E a alma se cala. Pois é exatamente disso que eu sofro hoje. De alma calada.

15 comentários:

Unknown disse...

oiêêê.. eu nem tinha vindo aqui te desejar feliz páscoa não foi?...
venho agora lhe desejar um finalzinho de páscoa melhor do mundo.. heheh \o/

bjooo

wanessa g. disse...

Que texto lindo. E foi muito melhor você ir escrevendo sem uma base pré-determinada, pois ficou tão bonito e natural. Parabéns, também acho que todos os nomes soariam melhor do que comédia-romântica, mas é isso que elas são rs. E é triste mas também choro com muitas bobagens de filmes clichês.

Ayanne Sobral disse...

Como eu não me ver em suas linhas?
Impossível.

Há exatamente duas horas e trinta e nove minutos estou tentando escrever sobre algo que eu nem sei o que é. De verdade.
Talvez esteja sofrendo desse negócio de alma calada também, e tenho medo que qualquer palavra posso macular o que, para mim, é imaculado.

É muito, muito bom quando alguém fala exatamente o que a gente deseja dizer, mas não sabe como. Obrigada. [de novo!]

Teus textos, Alicia, têm característica e vida própria e por isso cativam tanto.

Fã (:

Ayanne Sobral disse...

PS: Dançar em cima da mesa para fazer a digestão?

hahaha, boa. Muito boa.

Anônimo disse...

Grávida do tédio? Eu tô.

Ingrid disse...

isso nos acontece tanto..
e voce expressou com sinceridade..
beijo e uma boa semana.

Catia Bosso disse...

Ei, vamos escrever então sobre a Ressaca Pascal... Acho que vou arriscar umas linhas sobre isso....
Tô brincando, mas que diga-se de passagem, se sem ter o que escrever, já saiu um texto desses, imagina quando tu tiver inspirada, até me envergonho das minhas mal traçadas linhas.... rsrsrs

bjao pra ti

Catita

Lydia Llewelyn disse...

Ela começou falando da páscoa, e terminou falando do amor!

:)

Anônimo disse...

Perfeito!!! Minha alma é calada desde que eu nasci...

Ricardo Steil disse...

Lindo este final: pois é exatamente disso que eu sofro hoje. De alma calada. Parabéns. Já estou te seguindo.

Bruniele Souza disse...

ótimo post!
Acredito que todo mundo já desejou ter um amor meloso, daqueles cheios de aventuras loucas e desenfreadas!
auhauhahaha...
:D

Leonard M. Capibaribe disse...

Sofro do mesmo problema... Quando quero escrver, mesmo que demore, eu fico esperando até chegar alguma coisa que me faça começar. Por isso coloquei o nome do meu blog assim... De tanto ficar olhando para a tela branca e qurendo saber o que escrever... Gostei da conversa, digo isso porque me achei conversando com vc... =)

ítalo puccini disse...

a escrita de advém da não-escrita. acho bonito isso.

e ficou mesmo este teu texto.

abraços

Thaís Alves disse...

Às vezes a alma calada nos faz simplesmente olhar para dentro e se reescrever lá antes de se mostrar. Adorei! Beijos!

Lívia Azzi disse...

E mesmo quando você "nem sabe dar um título", que cai muito bem ao contexto, compartilha a angústia da página em branco, das linhas desconexas, daquilo que era para ser e ainda não é...

Persiste, refaz e nasce, quer dizer: corpo, alma e intelecto entram em sincronismo!

;-)