Páginas

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Alma subnutrida




Às vezes acontece que me somem os sentidos. Não; não se trata de olfato, paladar, audição, tato, visão. E também não, não se trata de desmaios.

Às vezes me somem os sentidos que eu dou pra vida. Essas coisas que nos fazem dormir acordados, como querer ser feliz, ganhar dinheiro, trabalhar no que se gosta e até mesmo escrever.

A imagem que tenho da vida nítida, colorida e vibrante, derrete. A idéia da vida bela, esvai-se.

Olho para o espelho e o vejo vazio. Meu reflexo já não está ali. A minha sombra não está mais no chão. Durmo e não tenho sonhos. Viramos um só. Eu e espelho. Eu e sombra. Cá e lá. Fantasia e realidade. Acordar e dormir.

O id (guloso que é), engole o superego (chato que é), e eu é que fico me retorcendo de indigestão.

Vida borrada, imagens misturadas, existência que vibra. Cadê esse tal de eu?

Faço laços com o mundo. E ao tentar desatá-los, faço deles, nós ainda mais apertados. É assim, normalmente.

Mas de repente, eis que "nós" é só "eu". E então eu consigo desatar os nós, e o que era um laço bonito vira puro fio sem-graça. Fio solto no mundo. Procurando por um curto-circuito. Dá-me choque na alma. Perco o meu corpo. Vago por alguma dimensão.

Sei lá onde é que eu existo. Só sei que aqui, eu deliro. Seja lá o que for eu...

20 comentários:

Anônimo disse...

Esse tal de eu? Esmagado entre o superego e o id, esses dois grandíssimos filhos da puta sem os quais não vivemos sem.

Talvez, à primeira vista, ter a alma subnutrida seja ruim. Mas ao menos é uma alma que tem fome. Pior é a alma saciada. Essa está morta. Sim, acho que almas morrem.

Vênus disse...

delire... delire pulsantemente.... pra quem, o que vem a ser? nem se preocupe... o que importa é sentir, assim como você expressa nessas linhas intensamente.

Fantasie a realidade... esse é o maior dom

Roberto B. disse...

e esse seu escrito desatou nós para nós.


gostei, gostei, como sempre.

Luz disse...

"Não quero a faca, nem o queijo...
Eu quero a fome"

[Adélia Prado]

Puro motor!

Rê_Ayla disse...

adoro seus textos...

Cláudia M. disse...

adorei...

BG disse...

Menos mal que alimento pra alma é fácil de encontrar. Difícil é saber o que comer, pra não deixá-la subnutrida!
Ontem a lua estava tão bonita, que me empanturrei!
Já provou a lua de numa noite de junho?

Mila Ferreira disse...

Eita duvida cruel é saber quem somos...
Simplesmente ameih seu texto: amo tudo o que vc escreve... é de uma inspiração tamanhã.


bjs

http://devaneiosfugazes.blogspot.com/

Nara Sales disse...

E, aqui ou aculá existes de forma maravilhosa.

Camila Lourenço disse...

Tb sou assim...e vou te falar, ando numa precisão danada de tirar férias de mim...

Flá Costa disse...

Acho que é isso mesmo, Alicia.
A gente acaba se descobrindo (e se perdendo) o tempo inteiro.

com o tempo a gente aprende.

-espero-

beijos!

Sandro Ataliba disse...

Viajei agora. Deu nó. Acho que quem delirou fui eu. rs

Lilian disse...

os meus faz tempo.
Beijo.

Lívia Azzi disse...

Eu também deliro com a fome da alma. Rubem Alves diz que o nome disso é saudade. Coisa que sentimos até do que ainda não vivemos...

Thaís Alves disse...

Nossa, o mais louco é que entendi perfeitamente o que você quis dizer. Acho que o segredo é atarmos outros laços, encontrarmo-nos novamente conosco, com outras pessoas, com outros objetivos, com outros gostos, nos reinventarmos e na briga do ID com o superego, JAMAIS deixar o ego de lado. Quando o nosso mundo se perde, é hora de construir outro melhor. Beeeeijos

Ayanne Sobral disse...

[eu não acredito que ainda não tinha visto isso aqui]

E porque eu vim ver? Pra me assustar. É, pra sentir medo ao encontrar aqui as palavras que eu não disse. Porque, Alicia, é isso que tenho vivido, é isso que tem deixado muda a minha alma. É exatamente isso, só me faltava ver escrito.

Sentido da vida, cadê?
Se é que ele existe, muda. Assim como nós mudamos e como mudam os nós que nos prendiam a ele, ou a vida.
Nem sei o que tô dizendo...
Só sei que [essa semana mais que nunca] tenho tido vontade de colocar o meu sapato de morrer, e não pedir licença, surtar, parar de respirar, renascer.

Porque eu existo litigiosamente.

Entrar aqui é dolorido. É dolorido ver minhas dores nas palavras de outra pessoa. É estranho.

Ayanne Sobral disse...

Obrigada.

[acho que só precisava dizer isso]

Anônimo disse...

Sempre só.

Raquel Lautenschlager Santana disse...

Alicia,conheci o seu blog,no blog
de minha sobrinha Mulher de30.
Através do blog Belas Artes Médicas.Parabéns.
Abraço.

Carina Destempero disse...

Só existimos no lapso do pensamento. E tenho a impressão que é nesse lapso que você escreve. Por isso o delírio é tão real.