Tem gente que diz que escrever é uma terapia, que a escrita faz bem e tal. Eu acho isso de uma hipocrisia tamanha. Me desculpem se eu ofender alguém, mas é que, pra mim, terapia é tudo aquilo que faz bem e ponto final. E quem escreve com a alma, sabe que escrever custa muito caro. As palavras não são bailarininhas de plástico, que a gente coloca numa caixinha musical, dá corda e as vê dançando. As palavras são perigosas, elas nos fazem refém. Escrever não é matar alguma coisa, deixar algo no passado. Escrever é dar vida às coisas mortas dentro de nós. Sabe criança, quando brinca com espírito e depois fica com medo? Me sinto assim quando escrevo. O sentimento está morto dentro de mim, muito bonitinho e cheirosinho, e então eu vou lá futricar. Espremo, cutuco, faço sangrar. E por mais que eu publique no blog, vocês leiam, comentem e depois eu desligue o computador, aquelas coisa têm vida própria. Quando eu fecho o blog, as letras ficam dançando aqui, secretamente. E o meu estômago se revira, e a minha alma tem espasmos. E olha que a minha escrita é bem pobrezinha. Leio gente por aí que escreve bonito e difícil, mas eu não sei fazer isso. Escrevo do jeito que penso. Louca e simples, assim eu sou, assim as minhas palavras são, e também os meus pensamentos. Vejam só, no post anterior eu disse que a felicidade atrapalha a escrita. Então vim aqui dizer do sofrimento que a escrita causa, e agora minha alma sangra. A felicidade ainda está aqui, mas eu a fiz sangrar. Porque só assim eu posso escrever. Me veio agora a imagem mental de uma criança com catapora. Ela tem várias bolinhas pelo corpo, e não deve coçá-las. Aqui, eu coço com muito gosto. Arranco a casquinha fora, ponho a ferida pra sangrar. É delicioso se coçar, mas sangra. Assim é a escrita, deliciosa e sangrenta. Nada terapêutico.
21 comentários:
Sabe Alicia,
Clarice Lispector dizia que escrever fazia com que ela se sentisse livre.
Eu compreendo.
E também o que você diz.
Eu escrevo para não engasgar. As vezes, os gritos silenciosos não trazem liberdade ou alívio, então escrevo para não ficar louca.
Mas, você tem razão. Transformar sentimentos em palavras (nem sempre certeiras) é perigoso. Como se elas ficassem mais reais.
E aquelas feridas que no começo você nem queria tocar, vão sendo cutucadas, cutucadas e dai eu pelo menos continuo enquanto tiver sangue ... pq algo dentro de mim sempre precisa de respostas.
Também acontece de ler algo que alguém escreveu e o tapa na cara aparecer antes do ponto final. Ou a ferida começar a latejar.
Mas, sei lá ... alguns gostam de deixar as dores quietinhas, como se não existissem.
Outras preferem sangrar e sangrar e sangrar.
Sei lá, mas se não matar, acredito que é uma forma de cura.
Doer tanto até que não possa mais.
Seus textos são sempre ótimos.
Menina, você é inspiração em forma de bom gosto. Parabéns.
São raras as vezes que me ponho a escrever, porque isso me mata de dor. Não sei se é dor física, sei que dói. E sempre que escrevo algo, choro no final, como se eu tivesse parindo algo, mas eu que estou nascendo... Adorei o texto, mesmo me causando certa dor incômoda aqui.
Alicia,
eu concordo com você! A gente porque está disposto a doar o nosso "não-ser" e a sangrar junto com ele. É assim que acontece. Muitos escrevem, e nem sabem o sentido que isso tem.
Parabéns a você, que escreve e sangra. Que aguenta a dor de sempre estar trocando as palavras.
Um beijo!
Passei o ano inteiro com a frase "escrever me liberta de mim", e liberta mesmo. Mas me liberta direto pra uma prisão: A prisão do julgamento, do entendimento.
Alguns nos leem e refletem, levam pra vida. Outros nos leem e nos julgam, dão nomes (a esses, meu FODA-SE bem grande) e outros, no entanto, nos leem e usam os fragmentos de nós mesmas, deixados nas palavras contra nós. Destes o mundo está cheio e estes, eu temo.
O mundo não é cor de rosa, nem escrever liberta ou é terapia de um jeito só, que só faz bem. Escrever é uma terapia sim, pq vc expurga seus demônios interiores, mas os expurga pra sua tela, tira-os da mente, coloca-os uma roupa bonita, mesmo que feia e solta-os no mundo. Aí, de só seus demônios, eles passam ser bichinhos de estimação dos outros, e os outros, geralmente, sabem fazer melhor uso deles que a gente. O que no caso, acaba sendo a recompensa de escrever.
Vc tem razão, escrever é sangrar, é a coceirinha na ferida já cicatrizada.
Mas, meu Deus, como é bom ceder à tentação e coçar até sangrar e depois ver a ferida se curar, de verdade e virar cicatriz tatuagem e nos fazer capazes cantar como Roberto: Eu tenho cicatrizes que a vida (e as minhas palavras) fez.
Escrever é um paradoxo. É voar direto pra prisão dos olhos e ouvidos alheios, e ali fazer morada e ver um pouquinho da gente no reflexo da vida de quem nos leu.
Bjo, minha Alícia do Pais das realidades.
Li e não quis interpretar mas refletir à questão de: Por que escrever?" É o ato de revelar ao mundo o que estava na alma, como diria Platão trazer algo do mundo das idéias para o sensível, tocar o intelecto, ferir ou massagear o ego, mas que sempre trazendo uma revelação à cognição coisas que eram ignorantes a alguém, o que sempre edifica, escrever pela necessidade ou anseio de se fazer conhecer, de iluminar a si e a mente de quem lê, pela compreensão de vida e de saber ler, entender e conhecer a Palavramundo, internalizar e compactar os sentimentos e sensações na caixa texto e eterniza-las no papel, no blog e mesmo depois de fechados "nas letrinhas dançando na alma". Mas simplesmente e tão forte, escrever é apenas a arte, o Belo, de juntar as palavras certas.
Você escreve de dentro. E sangrar é essencial.
(Vinicius Linné)
Só consigo escrever quando triste.
Beijo
Acredito que dependendo do nosso estado de espírito mostrar tudo o que sentimos é sinal de loucura, mas é também uma cura... As palavras são mocinhas e são vilãs...
bjs
Acho que escrever, pra cada pessoa, tem um significado diferente. Nem acho que seja questão de hipocrisia, e sim de sentir de forma diferente.
Quando eu sentava em frente a psicóloga, eu também tinha que mexer nessas feridas, ficar relembrando, me forçando a encontrar meus erros e acertos.
E, às vezes, mexer no que dói, procurando a cura, pode ser terapêutico, sim.
E, pra mim, escrever é isso. É terapia. Me faz um bem imenso, e acho que se eu não escrevesse, há tempos teria me afundando em mim mesma. E eu escrevo pra me entender.
Pra fazer as dores que já vivi, terem um sentido mais bonito.
'Escrever é uma maldição que salva', já disse mãe-Clarice.
Quem sou eu para desdizê-la?
Beijo, A.
:)
Também aceito a ideia de que a escrita não é uma terapia; nem sempre ela entretém; nem sempre traz felicidade. Pode, no entanto, trazer um bem-estar, quando, através dela, produzimos uma catarse. Aceito também a ideia de que as palavras nos traem; certamente, não estamos no controle dos sentidos, ignoramos os sileciamentos que vazam delas; a linguagem é opaca, não é transparente. Se nossa alma sangra, se as palavras nos causam sofrimento, se a escrita torna-se, assim, uma atividade dolorosa, disso não se segue que não sirva para afugentar nossos fantasmas, para restituir o que se perdeu em nós. Penso a escrita como uma atividade de que me ocupo para resolver um problema. É possível que, ao final dela, o problema ainda persista, mas vale o esforço, a entrega, a tentativa de domesticar as palavras que parecem desafinar-se com os sentimentos, desalinhar-se com os pensamentos e traçar a inexatidão dos dizeres que se calcam ininterruptamente sobre os já-ditos.
"Sabe criança, quando brinca com espírito e depois fica com medo? Me sinto assim quando escrevo."
Idem!
" E quem escreve com a alma, sabe que escrever custa muito caro."
E como!!
"felicidade atrapalha a escrita."
Isso!!
... além de amar essa imagem VIVA!
Bem lindo, Alícia! Cheio de vc, de mim e de muita gente!
Escrever, por vezes, é despertar os fantasmas que existem dentro de nós. Lindo texto, querida Alicia!
Muito verdadeiro tudo isso, Alicia. Escrever é perigoso demais, trás à tona tudo o que sangra e até às vezes nos faz ter uma hemorragia, daquelas interna.
"O sentimento está morto dentro de mim, muito bonitinho e cheirosinho, e então eu vou lá futricar. Espremo, cutuco, faço sangrar".
Tu escreves do jeito que pensa e tu pensa de uma forma tão linda e é por isso que te admiro, nhac.
Como diria o poetinha: 'É preciso um bocado de tristeza, senão, não se faz um samba não...'
Penso que o mesmo acontece com a escrita.
que 2012 venha repleto de criatividade e boas palavras!
Remexer e criar, dói, mas vale a pena...
Beijos,
PS: uma vez li por ai que escrever é receber inspiração divina, um sussurro do além, será?
Escrevo porque me atrevo. Escrevo pra me perder, e para me salvar; a encontrar respostas nas entrelinhas da vida que não vejo quando olho pela janela. Escrevo a janela, e o jardim inteiro. Escrevo também pra colorir sombras que vivem dentro do coração. Escrevo pra confessar minhas verdades e enfeitar minhas mentiras. Escrevo porque escravo. Escrevo pra nunca mais precisar escrever.
Ai, Alícia...
assim você me mata
mesmo!
suspirosss
Escrevendo, vou deixando pedaços de mim nas palavras. Criando personagens, tiro do meu sangue para os manter vivos. É uma terapia reversa.
Acho que a escrita pode ser tantas coisas... alegre, dolorosa, terapêutica. Como vc bem sabe, as palavras têm atitude, e o que irão te causar depende da intenção que coloca nelas. Se escreve sobre o que te dói, irão te machucar. Se relata coisas a fim de se entender, no fim podem ser terapêuticas... Beijos!
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