E essa tristeza que me toma?
Não sei, talvez seja mau-humor.
Algo sem motivo.
Minto. É claro que tem motivo. E de alguma forma, a gente sempre o sabe.
Sei tantas coisas em mim sem saber...
Meu corpo é tão inteligente! É por isso que ele dói.
Tenho vinte e muitos anos e todos os dias me corpo anuncia uma dorzinha.
Não sou maria-queixosa, é uma dor que me diz que estou viva, e não que sofro.
Fiz ballet clássico durante uns bons anos, tipo uma década. Minha professora dizia: bailarina sem dor é bailarina morta! Na verdade ela não dizia, ela gritava isso, muito brava. E eu levei ao pé da letra. Saí do ballet, não quis ser bailarina. Mas continuo me doendo pra saber que existo.
Uma articulação sussurra-me ao ouvido, um músculo fala mais firme, um tendão cantarola.
Mas há uma alergia, assim, uma coceirinha, que ah, essa me enlouquece.
É tipo aquela coceira nas costas que você beira a se arranhar, mas não consegue aliviá-la. Ou aquela coceira que anda. É uma coceira na alma. Não a alcanço, e ela dança em mim. Desdenha da existência do meu corpo e faz com que eu me sinta gigante pro meu corpo, minúscula pro meu corpo. Faz com que o meu corpo não seja a minha casa.
Se você está me lendo porque sempre me lê, sabe que tenho horror a conselhos. Não pense que estou sofrendo, é apenas o meu modo de viver.
Sim, minha alma está quase sempre desencaixada do meu corpo e é por isso que eu me movo. É por isso que eu não sou bailarina, mas danço. Vivo dançando.
A dança perfeita seria se eu não tivesse um corpo. O corpo me aprisiona. Quero sair daqui, sou claustrofóbica. Quero que me abracem, embora eu seja claustrofóbica.
Mentira, não tenho claustrofobia.
Tenho é uma vida mais ou menos que me faz escrever amenidades.
Queria eu sofrer muito pra poder escrever visceralmente.
7 comentários:
a tristeza é um sentimento muito belo. Pena que algumas pessoas a evitam. E muito útil também, principalmente para a arte (além do crescimento pessoal).
A tristeza é tão útil quanto a alegria e saber sublimá-la, um talento de poucos.
Parabéns pelo seu.
já disse ricardo alves: "nenhuma desilusão é inútil o suficiente que não possa ser transformada em poesia".
e eu digo que nenhuma dor também...
eu me sinto da mesma forma. estou aqui, mas não sou daqui. sou de longe. será que somos do mesmo lugar?
Que honra conhecer essa bailarina.
Ela tem uma das músicas mais belas que já ouvi e um balé inacreditável. Não, não falo de dança. Falo de palavras. Ela chove sensibilidade por todos os cantos e eu, aqui em baixo, abro a boca e o coração que é pra receber a poesia que vem dela.
Você dança bonito, bailarina. Mesmo quando as palavras saem num sussurro. A sapatilha machuca os pés, por vezes, eu sei. Mas a poesia te faz rodopiar bonito nesse palco.
Todo mundo tem mais corpo que alma, não tem? Tem. Só a bailarina que não tem.
Sobre o texto: Alícia, quer casar comigo?
Alícia, tu podes até não morrer aqui, mas tu me matou aqui: "O corpo me aprisiona. Quero sair daqui, sou claustrofóbica".
Se presa tu já escreve tão lindamente, 'magina solta? *-*
As palavras nos intensificam.
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